O
relato abaixo foi escrito pela madrugada um dia depois do
acontecimento, (considerando que passei alguns dias sem conseguir
dormir) e encaminhado a Corregedoria da Polícia Militar e ao Ministério
Público.
Meu nome é Sandra, sou funcionária pública a
10 anos. Atualmente sou Coordenadora Pedagógica de uma escola municipal
aqui em Goiânia. Sou formada em Pedagogia pela Universidade Federal de
Goiás, e Especialista em Educação Integral, também pela UFG, ou seja,
sou uma cidadã honesta e sem antecedentes criminais de qualquer especie.
O fato de eu ser negra, pobre e moradora de um bairro
periférico em Goiânia, onde há muitas ocorrências de trafico de drogas,
não dá a alguns policiais corruptos e mau caráter o direito de me tratar
como bandida.
Ontem, dia 23 de março de 2012, fui
agredida fisicamente, verbalmente e presa publicamente por policiais
militares na porta da minha casa.
Tenho certeza que um
dos principais motivos foi o racismo, pois o sargento me xingou inúmeras
vezes... e demostrou manifestações racistas e de intolerância a classe
social que pertenço.
Eu tinha chegado do trabalho (da
escola que atuo como coordenadora pedagógica) e estava sentada no sofá
da minha casa, quando por volta das 20 hs e 10 minutos, minha prima
chegou com seu esposo. Os dois estavam indo até a feira e passaram lá em
casa para falar comigo.
O esposo da minha prima entrou
cumprimentou e conversamos um pouco. Logo, eles decidiram se despedir e
seguir até a feira, e quando o Fabrício, (esposo da minha prima) foi
saindo para fora do portão, de repente chegou um carro de policia e um
dos policiais o sargento Manoel já desceu do carro gritando com o
Fabrício para que ele se encostasse no muro. E na maior estupidez,
mandou eu e a esposa do Fabrício entrarmos para dentro e fechar o
portão.
Eu disse que o rapaz estava dentro da minha
casa e que era conhecido. Então eles me mandaram sair de perto deles,
caso contrário usariam de força. Alegando que eu não poderia presenciar a
abordagem.
Assim, eu fui para o outro lado da rua com a
Nilzilene (prima). Um dos policiais, (o sargento Manoel) que se mostrou
o tempo todo mais estúpido e agressivo, perguntou se o Fabricio tinha
passagem pela policia, e ele respondeu que não. Ai pegaram os documentos
dele para confirmar pelo rádio da viatura.
O policial
ao ler o nome dele na identidade ao invés de dizer Fabricio, pelo radio
falou Francisco, ai eu disse que eles passaram o nome errado. Então o 3º
Sargento: Manoel Mendes de Moraes me mandou calar a boca e me xingou de
vagabunda. Disse ainda, que se eu dissesse mais uma palavra eu ia
acertar com ele. E como ele falou o nome do Fabrício errado, a resposta
da viatura veio dizendo que o tal Francisco com o sobrenome do Fabrício,
tinha passagem. Então o policial partiu para cima do Fabrício falando
que ele tinha mentido para ele, e que ele já tinha passagem.
Nesse momento, eu entrei no meu portão e peguei meu celular para
ligar para um amigo (advogado) e perguntar o que fazer naquela situação
pois o nome passado pelo policial estava errado.
Quando
ele (o 3º SG PM Manoel M M) me viu com o celular na mão ele gritou SUA
VAGABUNDA VC NÃO VAI FILMAR NADA AQUI NÃO, tomou o celular da minha mão e
mandou a mão no meu rosto. Ai eu falei para ele que eu poderia
processá-lo, pois conhecia meus direitos e sabia que ele não podia me
ofender com xingamentos muito menos me agredir. Ai ele me deu outro
tapa, torceu meus braços para trás, me algemou e me jogou dentro da
viatura.
O SG PM Manoel, foi me humilhando, me
agredindo verbalmente ate a delegacia. Ao chegarmos lá, o soldado Brito
desceu para verificar o melhor lugar para estacionar a viatura, nesse
momento, o sargento aproveitou que estávamos sozinhos e me ameaçou.
Disse que eu estava ferrada na mão dele e que ele era chefe dos
traficantes do meu bairro e que se eu o denunciasse ele mandaria um dos
traficantes me matar. Após fazer essa afirmação, eu disse ao sargento
que usaria o que ele falou para argumentar minha vulnerabilidade perante
a justiça. Então ele entrou em contradição e afirmou que se eu
insistisse em dizer que ia até a corregedoria, eu só teria problemas
pois processos ele já tinha muitos e que esse não ia fazer diferença
para a vida dele, mas para minha sim.
Ao chegar na
delegacia ele mudou completamente seu comportamento e ficava comentando
com os outros policiais que eu havia os agredido e desacatado. Enquanto
eu permanecia de pé no meio da sala de recepção do 8º distrito da
policia civil no setor Pedro Ludovico, o Sargento Manoel formou uma roda
com outros PMs que estavam lá, na parte de fora da delegacia, e mexiam
no meu celular buscando identificar se eu havia feito alguma gravação.
Devido ao constrangimento e humilhação que eu estava passando,
com todas as pessoas presentes me olhando, eu só conseguia chorar. Alem
da vergonha, as algemas me machucavam muito.
Enquanto
eu esperava lá de pé servindo de espetáculo para todos, o sargento
Manoel passava perto de mim e ria da minha cara. Entrava na sala do
delegado conversava com ele e saia rindo e me olhando, uma forma de me
humilhar e intimidar.
O outro policial que estava com o
sargento que me agrediu, (o soldado Brito) em particular, me pediu para
ser justa e não envolvê-lo no processo que eu pretendia montar contra o
sargento Manoel que me xingou e agrediu fisicamente. Disse que ele não
podia fazer nada para me ajudar lá dentro, que não poderia ir contra o
sargento, mas que eu deveria mesmo ir ate a corregedoria porque eu
estava certa; segundo ele o sargento agiu com agressividade e
utilizou-se de excessos desnecessários'. Disse ainda, que se ele
estivesse mais próximo a mim, no momento da agressão, teria impedido que
o sargento me desferisse os tapas e empurrões.
Quando
fomos para o IML fazer o exame de corpo delito, o sargento que me
agrediu foi dizendo que estava nervoso tentando me fazer desistir do
processo, claro, depois que viu toda a minha família na delegacia e todo
mundo com celular cada um ligando para uma outra pessoa na tentativa de
arrumar um advogado.
Com certeza o sargento Manoel
percebeu que eu não era uma negra pobre, ignorante e vagabunda como ele
havia me qualificado. Notou que tenho uma família e amigos que me apoiam
e que se deslocaram de suas casas até a delegacia para me apoiarem. E
que na mesma finalidade seguiram a viatura ate o IML para também me
proteger.
Minha irmã que cursa direito na catolica
chegou e pediu para os policiais tirarem minha algema, afirmou que não
havia necessidade de que eu permanecesse algemada, pois eu não
representava risco algum a integridade física ou moral de qualquer
pessoa. Só ai tiraram as algemas... Eu já havia feito essa solicitação
várias vezes, repeti que sou educadora e não era necessário me manterem
algemada como se eu fosse uma criminosa.
Nunca fui tão
humilhada e ofendida... Tenho certeza que entre outros um dos motivos
foi discriminação racial. Se o Fabrício e eu fossemos brancos ele não
teria agido assim. Meu esposo também saiu para fora do portão, e nem
assim eles o mandaram ir para o muro, (detalhe, meu esposo e minha prima
possuem pele mais clara).
Acredito que o sargento
teria me agredido ainda mais, se não fosse a manifestação clara de
desaprovação e intervenção por parte do soldado Brito.
Preciso de um advogado para me defender no dia da audiência e para me ajudar no processo contra esse policial.
Tenho a cópia do relato dele e do meu. Entretanto ele mentiu
vários fatos. Chegou a afirmar em seu relato que minha casa é um ponto
de venda de drogas, para justificar sua ação injustificável. Felizmente
tenho como provar que tudo o que ele disse foi mentiras. O sargento
Manoel, em seu depoimento, alegou ainda que me prendeu por que eu sai de
dentro de casa gritando, os xingando, e que eu portava um objeto não
identificado (no momento) nas mãos. E que ele pediu para eu colocar o
objeto no chão e eu desobedeci as ordens dadas...
.
Assim, ao chegar em casa depois de passar toda a noite na
delegacia, meu esposo me relatou que o sargento Manoel, o chamou para
fora do IML e pediu para ele me convencer a não processá-lo, pois estava
nervoso no momento que me agrediu.
Mas eu não vou, e
nem posso mudar de ideia e deixar de processá-lo. Ele me chamou de
vagabunda e me bateu na frente de todos os meus vizinhos, da minha
família (mãe, pai e esposo) e o que é pior, na frente dos meus dois
filhos menores. (12 e 6 anos de idade)
O sargento
Manoel ficou totalmente descontrolado, parecia estar fora de si. Volto a
dizer que se o outro policial o soldado Brito, não estivesse tentando
acalmá-lo o tempo todo, com certeza ele teria me agredido ainda mais.
Pensei que o delegado ia me ouvir. Mas ao contrário, apenas a
escrivã me ouviu. O delegado só entrou na sala, onde eu estava tentando
esclarecer os fatos, para assinar o documento e passar meus dados pelo
telefone.
No dia 4 de junho de 2012 acontece a
audiência onde serei julgada por desacato a autoridade policial...
Irônico, não é mesmo?
quarta-feira, maio 09, 2012
9 DE MAIO
Hino da União Soviética em português
Por V. Tavares