sexta-feira, setembro 02, 2011

PIAUÍ

E eles dizem que o protesto é violento...
Por Cristiano Alves

Protestos explodem pela capital teresinense e despertam a fúria da elite local. Jornais demonizam as manifestações da massa sofrida, imolada por um calor de mais de 40 graus, e agora chamam-nos de terroristas, mas será que as acusações de jornalistas desesperados fazem algum sentido?


Populares na escadaria da Prefeitura Municipal de Teresina
 
Ao longo da história, conforme demonstrado em várias obras a respeito, ficou constatado que o diálogo nunca resolveu nada, ao menos no que diz respeito a reivindicações de cunho social. Manifestações e revoltas ocorrem desde a antiguidade, especialmente na Roma antiga, onde a plebe miserável trabalhava incansavelmente para sustentar os privilégios de classe dos "patrícios", os únicos que tinham voz no senado. A tentativa pacífica dos tribunos Caio e Tibério Graco, representantes legítimos da plebe, de realizar uma reforma agrária que beneficiasse o proletariado romano, isto é, a classe daqueles que produziam, levou ao assassinato de Tibério e à decapitação dos partidários de Caio Graco, que foi perseguido até pedir que o matassem. A revolta de Spartacus contra as condições abusivas da plebe de Roma levou à crucificação deste e de quase todos os seus partidários na Via Ápia, principal avenida romana.

Florian Geyer, nobre e cavaleiro que liderou a revolta dos camponeses contra a própria nobreza na Alemanha, no século XVI

As classes dominantes não abrem mão de seus privilégios facilmente, a luta pelo direito sempre foi marcada por protestos e muito frequentemente pela luta física, revoltas na Roma antiga, no Império Bizantino podiam assumir diferentes proporções, mas sempre tendo um fundo social, como a revolta de Nika, que em muita coisa lembra as cenas que se vê em metrópoles como Fortaleza ou São Paulo, onde torcedores agitados, muitas vezes desempregados, vêem em brigas de torcida uma válvula de escape para uma situação de miséria. Isso não implica dizer que todos os torcedores daquele time são "vândalos". No Piauí, manifestantes são apresentados como vândalos em razão da ação da massa sofrida e ignorada, sem voz no poder, o mais pacífico dos manifestantes apresentado como um "baderneiro, arruaceiro, bandido" e agora até mesmo terrorista, segundo Pádua Araújo, mais um farsante que brinca com os sentimentos de justiça do povo ao meio-dia, vivendo às custas da ignorância alheia e atiçando nas massas ideologias de ódio, chegando ao extremo de clamar pelo "Estado de Sítio". Não sabe este ignóbil que a Constituição da República Federativa do Brasil tem regras específicas para a decretação do Estado de Sítio (1), e se este ao menos uma vez na vida se desse ao trabalho de ler a revista da Agência Brasileira de Inteligência(ABIN), saberia que há uma série de critérios para designar uma "organização terrorista". Uma de suas edições define, por exemplo, que existe uma diferença entre "movimento revolucionário ou social", "organização criminosa" e "organização terrorista", todas podem se usar de ações terroristas, o que não as caracteriza necessariamente como "organização terrorista". (2)

Pintura de uma cena não rara da Revolução Francesa, uma cabeça decapitada de um aristocrata é exibida em público. A Revolução Francesa garantiu os direitos em vigor na maioria dos países civilizados, tais como o de liberdade
Alguns reacionários de plantão da capital piauiense falam em "guerra civil promovida pelos estudantes". Desconhece-se o que esses indivíduos aprendiam em aulas de história, se é que as frequentavam(e talvez o fato de terem vivido uma ditadura fascista militar agrave o quadro), porém se estes tivessem ao menos estudado um pouco sobre a Revolução Francesa, a Revolução Russa e a vizinha Revolução Cubana jamais se atreveriam a proferir tamanho impropério pelas ruas. É esse mesmo universo de analfabetos políticos que vê no manifestante um "bandido", que acha(enfatize-se acha, e não "pensa") que é o "fim do mundo", ou melhor, o "fim do Piauí", pelo fato da população não estar mais de braços cruzados assistindo a tudo passivamente. Passou-se o tempo de assistir a tudo, passou-se o tempo dos "protestos pacíficos", que mesmo tendo sido promovidos em meses anteriores não surtiram efeito. Passou-se o tempo de acreditar no que dizem os jornais teresinenses como "O Dia", que trabalham dia e noite na demonização de um movimento de caráter social. Será que os infames donos desse jornal sabem que nos anos 60, na Alemanha, uma bomba foi colocada na sede do jornal Springer, um inútil jornal reacionário conhecido por demonizar os movimentos sociais e as lutas dos povos do terceiro-mundo? Toda ação corresponde a uma reação, ensinamento elementar que vem primeiramente não de aulas de história, geografia ou filosofia, mas de aulas de ciência, de química, física, ciências exatas. A Prefeitura Municipal de Teresina, teleguiada pelos empresários que financiaram os seus gestores, dentre os quais o prefeito Elmano Ferrer, promove medidas anti-populares que provocam as massas da capital, seja ela de estudantes, de trabalhadores, comerciantes, dentre outros. O estudante, diferente do trabalhador, goza da imunidade às perseguições dos patrões, estando estes últimos sempre prontos para demitir este ou aquele trabalhador por "promover arruaça", "por ser um agitador comunista". É triste o destino daquele que fica "queimado" no mercado de trabalho por participar de movimentos de reivindicação social, esta é a pior censura e o mais desavergonhado estupro aos princípios da Constituição da RFB, é a fogueira profana de uma nova inquisição secular e capitalista, reacionária e anti-popular, que identifica no manifestante uma persona non grata para o mercado de trabalho, que passa a representar para a sociedade teresinense o mesmo que um leproso na Idade Média. Afinal, quem contrataria um "vagabundo que participa de baderna e não quer trabalhar", o "baderneiro", o "demônio comunista" em uma loja, colégio ou fábrica? Isso explica por que os estudantes compõem o grosso da manifestação.

Cena da Revolução Russa, onde seus líderes instruem os operários, camponeses e soldados a derrubarem o poder do tzar, o antigo soberano da Rússia. A Revolução Russa originou muitos dos chamados "Direitos Constitucionais de 3ª geração", tendo também criado a primeira Constituição da história do homem a criminalizar a discriminação racial
Muitos espantam-se com o novo acordar das massas de Teresina, acham que "isso é uma maldição que só acontece no Brasil", esquecendo-se das lutas populares em Londres e em Santiago do Chile, nos dias atuais, esquecendo-se de lutas passadas na Alemanha Ocidental, nos anos 60, dirigidas pela carismática Fração do Exército Vermelho(RAF), que e acordo com estudos do Instituto Allensbacher contava com o apoio de 23% dos jovens alemães, isto é, mais de 7 milhões de pessoas. A ação destes jovens, que muitas vezes foram obrigados a recorrer à luta armada pelas autoridades alemãs, impediu que o país assistisse a uma ressurreição do nazismo naquele país. No Brasil, a luta pelos direitos sociais, contra a ditadura dos latifundiários e empresários(injustamente atribuída exclusivamente aos militares), levou à redemocratização do país, no curso dessa luta, nem sempre as ações foram pacíficas, afinal, uma luta por direitos sociais não é como ir a um coquetel ou participar de um jantar de gala. Mas comparada às bombas, extensivamente usadas na Europa do século XIX, à Revolução Francesa, que cortou a cabeça de reis e aristocratas para garantir direitos elementares dos quais desfrutamos hoje, a ação da população de Teresina limita-se a fechar cruzamentos, realizar passeatas e queimar sacos de lixo na avenida principal. Recentemente, dois ônibus foram queimados, uma vez que a população não mais os vê como um serviço de sua utilidade, antes os preços abusivos que vem a tornar o transporte coletivo municipal quase "de elite".

Revoluções vieram a moldar o mundo em que vivemos hoje, foi graças a essas ações, muitas vezes violentas, que hoje o cidadão não precisa deixar que sua esposa durma primeiro com o prefeito da cidade após o casamento, como acontecia na Idade Média com a humilhante lei da prima nocte, obrigação do servo para com o seu senhor feudal, revoluções e lutas duras, que em não raros momentos ceifaram milhões de vidas, cortaram cabeças, trouxeram até mesmo a guerra e a fome. E hoje alguns, tão bem manipulados e envenenados pelos setores elitistas da mídia, desprovidos de qualquer solidariedade para com o povo trabalhador e estudante, olham para os jovens manifestantes que fecham o trânsito e caminham pelas ruas em nome de uma causa justa, em prol da coletividade, e dizem que "o protesto é violento", que "a capital está entregue ao caos".



Exemplo de demonização de protesto em Londres na BBC News:



Fontes:

1- Segundo a Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 137, "O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de:
I - comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;
II - declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira."

2- REVISTA BRASILEIRA DE INTELIGÊNCIA. Brasília: Abin, v. 3, n. 4, set. 2007. Em: http://www.abin.gov.br/modules/mastop_publish/files/files_48581dbdd7d04.pdf

2 comentários:

Anônimo disse...

Recomendo aos leitores e mediadores do blog a leitura do livro Rumo a Estação Finlândia, de Edmund Wilson, assistirem o filme The Soviet Story. Eles mostram o quão belo e humanitário foi o ideal marxista e a revolução aplicada por lenin e stalin, que seguiram à risca os ideais preconizados por marx e engels. Se puderem, leiam também alguns artigos escritos por marx e engels no jornal Listener.

Anônimo disse...

O filme "The Soviet Story" é um documentário anticomunista feito na Estônia. Para quem não sabe, a Estônia é um dos únicos países da União Européia que promovem abertamente as idéias do tirano e facínora alemão Adolf Hitler. Esse filme tem tanta valia quanto o documentário "O eterno judeu", produzido na Alemanha nazista.

O ideal humanitário aplicado por Lenin e Stalin tirou da miséria milhões de trabalhadores e trabalhadoras da Rússia. Ele demonstrou que é possível criar uma sociedade sem a exploração do homem com saúde e educação de qualidade para todos.